by Telma M.
Eu nasci com asas.
Depois as perdi, mas, nasci com um par de asas enormes e bem fortes, capazes
de voos incríveis.
Quando completei 5 anos, finalmente entendi que deveria
escondê-las bem escondidas, pois as outras pessoas não aceitavam muito bem uma
criança voadora.
Não se apavorem, eu nunca fui de ficar esvoaçando em torno de ninguém. Incomodando como se fosse uma mosca ou uma daquelas asquerosas baratas voadoras,
ou pior ainda, como se fosse uma borboleta.
Eu preferia realizar meus voos
enquanto estava em meu quarto ou mesmo no quintal na companhia de meus amigos
invisíveis e dos livros de histórias encantadas. Algumas vezes eu fazia viagens
fantásticas a outros mundos, de onde era bem difícil voltar, pois a fantasia é
sempre mais bonita do que muitas realidades.
Meus pais, depois de muita batalha, conseguiram me fazer compreender a
necessidade de esconder minhas asas. Era isso ou um corte radical. Apesar da
pouca idade eu optei pela melhor solução: Cortar apenas as pontas e escondê-las
sob as roupas. Mas antes tive de ouvir um longo discurso explicando os perigos
de se exibir um par de asas numa comunidade caminhante bípede e depois foi
preciso prometer, jurar que nunca iria deixá-las serem vistas por olhos humanos.
Bem, eu sempre fui uma menininha muito obediente e cumpridora de regras, por
isso passei meus melhores anos caminhando e tentando ser realista, mas a minha
menina sonhadora sempre esteve escondida por aqui, em algum lugar.
Meus pés se fixaram no chão e eu esqueci como é que se fantasia, como se
sonha, como se é feliz.
Quando meus filhos nasceram eu tive uma recaída. Enchi a casa de livros de
histórias infantis, sentei no chão com as crianças e tentei voar com eles, mas
me pareceu ser tarde demais, minhas asas não conseguiam se abrir e meus pés não
conseguiram levantar nem um milímetro do chão.
Eu me lembro de, quando criança, ter presenciado uma cena que me marcou
profundamente: Alguém cortou as asas de um pequeno periquitinho verde. Depois
disso ele não ficava preso em nenhuma gaiola, mas também nunca mais pode voar.
Ficava andando sobre um poleiro comprido. Vez ou outra entrava numa gaiola sem
portas para se alimentar e dormir. Certa vez o pobrezinho caiu no chão... O
periquito não foi encontrado nas imediações. Eu procurei pela casa toda,
procurei no quintal, na vizinhança, mas o “Quito”, como era chamado, nunca mais
foi visto. “Ele foi embora”, disseram.
Suspeito que Romão, o gato, se alimentou bem naquele dia...
Seja como for, eu não quero ter o mesmo destino. Minhas asas estão bem aqui,
apenas escondidas. Posso voar! Meus livros estão bem ali ao lado, em minha
biblioteca, basta lê-los e liberar minhas asas novamente, posso fantasiar e
posso ser feliz o quanto eu quiser.
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